Num fim da tarde, não se via um entardecer, nuvens pintavam o céu de uma escuridão tão densa, que parecia nevoeiro. Na praia, sentado nas rochas, um homem, olhava o mar, que parecia estar calmo, antes da tempestade que se azinhava.
O que parecia um fim do dia calmo e tranquilo, logo se demostrou ser uma grande tempestade, o vento soprava com força, puxando pela chuva, também picava as ondas do mar. Mas o homem não temeu, seu coração estava calmo.
Ele continuava a olhar o mar, lembrava-se quando era um pequeno jovem, ansiando pelo mar, pelas viagens, e pelas as histórias que os marinheiros e pescadores contavam. Lugares mágicos, que cativam qualquer criança, bons tempos, aqueles que eram. Na areia uma jovem menina brincava, construindo castelos de areia. Ela estava tão feliz e despreocupada, estava focada no que fazia.
Enquanto a tempestade se aproximava, o homem permanecia imóvel. A sua mente viajava por memórias antigas, como um barco levado pelas marés do tempo.
Lembrava-se de como sempre sonhara em explorar o mundo, mas acabara ficando preso na rotina que o afastara do seu espírito aventureiro.
Sentia, no entanto, que a calma do coração que hoje carregava era resultado da aceitação desses caminhos trilhados, e não um arrependimento. A menina na areia olhou para ele por um momento. Seus olhos curiosos, carregados de uma inocência tão pura, pareciam capazes de enxergar além das nuvens escuras. Sem perceber, ela transformara o pequeno castelo de areia em um símbolo de resistência, como se mesmo diante da tempestade, houvesse algo belo e eterno a ser construído.
O vento começou a soprar com mais força, e a menina correu até o homem, procurando abrigo. Ele olhou para ela e sorriu, como quem entende que a vida é cheia de encontros que deixam marcas. Ele disse, com uma voz firme mas tranquila, "Não temas, pequena. Por vezes, as tempestades vêm apenas para lembrar-nos de nossa força e da beleza que podemos encontrar mesmo nos momentos mais turbulentos."
Juntos, permaneceram ali, observando as ondas ferozes, enquanto as lembranças continuavam a dançar na mente do homem. Ele percebeu que havia algo mágico em como aquela menina, tão jovem e despreocupada, podia trazer de volta a esperança e o encanto dos tempos de juventude. No final, ambos sabiam que, tal como a tempestade, tudo na vida passa, e tudo deixa a sua marca.
A mulher, agora feita de experiências, permanecia sentada nas rochas ao pé das dunas num entardecer que mesclava o dourado do sol poente às sombras tênues do ocaso. O mar, eterno confidente dos seus pensamentos, estendia-se em ondas que sussurravam memórias.
Em cada batida das ondas, ela via a imagem do homem que, tantos anos atrás, com uma voz serena e firme, a havia ensinado a enfrentar as tempestades da vida sem temor um ensinamento que lhe fazia recordar a presença de um avô, figura de amor e segurança.
Por instantes, os seus olhos deixaram o olhar fixo no horizonte para se perderem na paisagem da praia. Ali, entre os pescadores que, com mãos calejadas, cosiam as redes com a mesma dedicação que o homem exibia, via a continuidade de uma tradição e de uma paixão inerentes à vida junto ao mar.
Cada nó, cada movimento ritmado, parecia carregar a essência de histórias antigas, ecos de dias em que o tempo se fazia mais lento e os segredos do oceano eram partilhados em murmúrios entre as ondas. Essa visão enchia-a de uma nostalgia doce, recordando os dias de infância e de descobertas, quando a vida se apresentava como uma aventura sem fim.
A brisa suave misturava o cheiro salgado do mar com a memória do velho homem, e por um breve momento, ela sentiu que o tempo se curvava à sua vontade. O mar, com a sua imensidão e mistério, ensinara-lhe que cada tempestade, por mais forte que fosse, dava lugar à calma e a novas perspectivas.
Aquela companhia invisível dos elementos e dos rostos que o tempo levou fazia-a sorrir. Sabia que, apesar dos ventos incertos e dos dias sombrios, os laços que construiu permaneceriam. Gravados como pegadas na areia que nem mesmo as marés poderiam apagar. Assim, enquanto os últimos raios de sol se despediam no horizonte.
A mulher permitia-se voltar cada página daquele passado repleto de ensinamentos e de afeto. Sentada naquele cenário intemporal, compreendia que a beleza da vida residia na capacidade de transformar cada lembrança em força e cada encontro, por mais breve, em um legado que perdura.
O mar continuava a contar histórias e ela, com o coração em plena comunhão com aquele cenário, sabia que, como as redes dos pescadores, os momentos da existência se entrelaçavam, sustentando o fio invisível que a unia à essência daquele homem que, um dia, chamou de avô.
A paisagem, agora envolta num clima de melancolia e esperança, que deixava vislumbrar o passado e o presente pois se fundiam numa dança contínua de renovação. Assim, enquanto a noite se aproximava e o mar calmava o seu murmúrio, ela respirava profundamente, pronta para a próxima etapa da sua própria viagem, uma viagem onde o coração sabe que, mesmo nas tempestades da vida, há sempre espaço para a beleza, para a memória e para o reencontro com a própria essência.
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